quinta-feira, 16 de agosto de 2012

Antropofagia


Em 1922 houve a semana modernista. Uma verdadeira revolução cultural que chegou com a intenção de provocar e mostrar que no Brasil também pode-se produzir arte de qualidade e com personalidade.

O movimento modernista não teve muitos adeptos logo de cara, mas aos poucos foi ganhando força, até que em 1928 foi lido pela primeira vez o Manifesto Antropofágico de Oswald de Andrade.

Basicamente os antropofagistas queriam consumir todas as outras culturas, devorá-las como uma deliciosa sobremesa, aprender todas as técnicas, todas as formas e só então criar algo autenticamente tupiniquim. Algo que definisse a arte brasileira, não mais como cópia de outras culturas, mas que pudesse tornar-se a tradução artística deste país de gigantescas proporções.

Se em 1928 estávamos descobrindo a arte, já há algum tempo vemos isso acontecer na gastronomia. Renomados chefs buscam a alma gastronômica brasileira e entre esses chefs está Guga Rocha. Um verdadeiro antropofagista contra as elites vegetais. Em comunicação com o solo.

Cozinheiro, apresentador, escritor, maloqueiro e apaixonado pelo Brasil (como o próprio se define em seu blog) mistura técnicas da alta gastronomia com ingredientes de raízes nacionais na composição dos novos clássicos da gastronomia brasileira.

Guga fez Direito, Administração, Marketing, foi diretor de uma clínica pediátrica, teve uma banda de rock. Formou-se em Gestão Gastronômica e foi revelado ao público pelo quadro Superchef, do programa Mais Você. Atualmente (entre várias outras atividades) é um dos apresentadores do programa Homens Gourmet no canal Bem Simples.

Ufa... e me parece que seu objetivo no momento é explorar os sabores da terra pela qual é apaixonado e faz questão de gritar aos quatro ventos.

Não só gritar, mas escrever também. Junto com Leda ALmeida escreveu o livro "Um sabor quilombola", sobre a história da cozinha dos quilombos.

Vamos ao quilombos então. A palavra tem origem nos termos "kilombo" ou "ochilombo", e originalmente, designa um lugar de parada para nômades. Mas foi aqui no Brasil que o termo passou por uma certa adaptação antropofágica e ganhou o sentido de comunidades de escravos fugitivos.

Os escravos que formavam essas comunidades quilombolas por sua vez, tentavam manter ali as tradições e culturas de suas origens africanas. E reproduzindo receitas africanas com ingredientes em terras brasileiras... bom já deu pra entender um pouco da inspiração do chef Guga Rocha para sua cozinha tropicalista.

E já que só a antropofagia nos une, socialmente, economicamente, filosoficamente, e porque não, gastronomicamente, fui eu preparar um dos pratos deste chef, sem deixar, é claro, de fazer algumas personificações.


Faça uma marinada para 4 antecoxas de frango (se for galinha caipira, melhor ainda) usando suco de 1 limão, 2 cebolas e 2 dentes de alho devidamente picados, meia xícara de cachaça, sal, azeite, pimenta do reino e algumas gotas de tabasco (infelizmente não tinha pimenta dedo de moça em casa na ocasião). Cubra e deixe na geladeira de um dia para o outro.

No dia seguinte... Na panela de ferro aqueça óleo de coco e frite o frango (sem a marinada) até ficar bem dourado. EU aproveitei este tempo para cozinhar 500g de mandioca na panela de pressão até que ficasse bem molinha.

Frango frito, acrescentei o leite de coco e a marinada e deixei cozinhar por cerca de 1 hora em fogo brando (ou o tempo que seja suficiente para que a carne já esteja bem macia). Quando a mandioca estava pronta juntei ao frango e deixei por mais 15 minutos. Acrescentei meio maço de couve manteiga, mexi bem, tampei a panela e deixei cozinhar novamente por mais 15 minutos.

galinhada de terreiro

Servi acompanhado de arroz e harmonizei com uma deliciosa cerveja que ganhei de presente de aniversário da minha mãe. A cerveja escolhida foi a Kwak.

cerveja kwak

Esta cerveja combinou muito bem por ter sabores marcantes e equilibrados, e por seu aroma e sabor adocicados. Possui cor avermelhada, espuma de média duração e é um tanto quanto licorosa ao paladar, além da presença de especiarias.

Quanto à galinhada... Pára tudo.

Molho cremoso, carne macia, mandioca se desmanchando, bom demais. Definitivamente leite de coco entrou para minha lista de ingredientes indispensáveis.

Ficou incrivel e sem a baba do quiabo da receita original (desculpa Guga, mas baba na cozinha, só se for a de moça).

Assim aconteceu mais um jantar no matriarcado de Pindorama.

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